O esporte é feito de emoções. De momentos que coroam uma trajetória repleta de foco, abdicação e muita entrega. É sinônimo de vitórias, quebras de recordes e superação. Mas ele também é feito de pessoas, seres humanos que erram e que nem sempre estão no seu melhor dia. O esporte também é sinônimo de derrotas, lágrimas e frustrações. Mas o que nós mais vemos por aí são os relatos dos momentos de glória, do sorriso largo estampado no rosto e da sensação de que tudo valeu a pena. E quando isso não acontece? Qual a história de quem perde, aquela que ninguém conta?
Por instantes esquecemos que o esporte é mais do que uma medalha de ouro. Esporte é sobre determinação e resiliência. É sobre ganhar em um dia e perder no outro, mas sobre nunca se dar por vencido. É bom lembrarmos que a vitória é sim deliciosa, mas é a derrota que nos faz mais fortes e corajosos. Na série de reportagens especiais “A história que ninguém conta”, você vai conhecer a história de 6 atletas – grandes nomes do cenário nacional e internacional, que também tiveram seus momentos de derrota. Começamos hoje, com a nadadora Jhennifer Alves:
Imagine que você é um atleta de alto rendimento, que dedica seu dia à treinos, alimentação saudável, descanso e faculdade, e repete isso sete vezes na semana; incansavelmente. Isso tudo pelo sonho de todo atleta: participar de uma edição dos Jogos Olímpicos. Mas aí vem uma pandemia e bagunça todo o roteiro, te obriga a parar de treinar, a se isolar dentro de casa e ver o tempo, o precioso tempo, passar rápido demais. E um ano depois desse hiato, no limite para a conquista de uma vaga olímpica, o seu resultado não é suficiente. O dia da disputa não era o seu melhor dia, mas não existe outra chance.. ela era única e agora está no passado.
Foi exatamente isso o que aconteceu com a atleta Jhennifer Alves, primeira brasileira a conquistar uma medalha de ouro na natação em toda história dos Jogos Universitários Mundiais (antiga Universíade), que por pouco ficou de fora de Tóquio 2020. “A gente sabia que era uma chance que eu tinha, só uma. E nunca foi assim, sempre foi mais de uma chance pra fazer o índice olímpico, e essa foi a primeira vez nesse formato, e depois de uma pandemia, onde todo mundo sofreu”, conta Jhennifer. Apesar dos esforços e da tentativa, o tempo que ela fez não foi suficiente: “Chegou à noite e eu acabei não fazendo o índice. Eu nadei muito acima do que eu tinha já nadado de manhã, e aquilo ali foi uma surpresa não só pra mim, mas pra todo mundo”.
O tempo acima do esperado foi só a ponta do iceberg, o resultado de um ano atípico e de um mundo caótico. Aquele momento no espaço tempo em que tudo parece desmoronar e o sonho dos Jogos Olímpicos precisa ser adiado.
– No dia da minha proava eu nadei muito bem de manhã e todo mundo meio que estava falando ‘é impossível você não fazer o índice olímpico’. E eu não tinha dado meu 100% de manhã, eu sabia que poderia ter sido muito melhor, eu estava sem noção para que tempo eu estava nadando, e de manhã foi basicamente só para classificar. E eu nadei de uma forma não tão consciente do que eu estava fazendo e acabei dando um tempo muito próximo do índice olímpico, sem querer. Então foi uma surpresa quando eu bati a mão, olhei o placar e vi todo mundo comemorando. Todo mundo realmente teve a impressão de que eu poderia dar muito mais, então já estavam contando que eu faria o índice a noite – relembra Jhennifer.
Só que ao invés de funcionar como um catalisador, algo positivo, a expectativa criada e externalizada por todos fez Jhennifer ficar ansiosa: “Sem querer eu fui absorvendo essa pressão, não que foi uma pressão, mas dentro de mim eu absorvi nesse sentido”. E se eu nadar mais forte e não der? E se não for suficiente? E se eu fracassar? E se.. “Aí esses ‘e se’ foram tomando conta de mim inconscientemente, e eu não consegui descansar com aquela adrenalina toda”, destaca. O resultado disso tudo foi um tempo maior do que o esperado e a não conquista do índice olímpico. “Todo mundo falou ‘era uma outra Jhennifer nadando ali, não foi a mesma que nadou de manhã’. Então isso foi o que mais me marcou até hoje na minha carreira, e acredito que vai ficar ainda por um bom tempo”.
– Eu confesso que logo depois eu fiquei um tempo estática, eu não conseguia absorver o que tinha acontecido, eu estava um pouco sem acreditar, parecia que eu não tinha nadado. Para mim até hoje parece que eu não nadei aquela final, que eu não compareci. Quando a gente não nada bem a gente sente aquela dor, sente tudo, você quer chorar. E quando você ganha, você sai da piscina pulando, dando cambalhota, porque é um momento gostoso, mas também passa muito mais rápido do que a derrota. A derrota você fica internalizando ali e querendo buscar o melhor, então eu aprendo mais com as minhas derrotas, isso me impulsiona muito mais. As minhas derrotas serviram pra me tornar a Jhennifer que eu sou hoje – finaliza a atleta.